terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A Nossa História

“Na era moderna, a cidadania é exercida através das chamadas «instituições intermédias (associações cívicas, etc.) É através deste tipo de associações cívicas que as pessoas dão o melhor de si, ultrapassando as suas preocupações egoístas. (…) Elas traduzem-se em «pequenas acções diárias de sacrifício pessoal» acessíveis a um maior número de pessoas.
Numa grande democracia moderna, a vida associativa privada tem efeitos gratificantes muito mais imediatos do que a simples cidadania… “Francis Fukuyama, O fim da História, Gradiva


Os Estudantes Africanos (Lusófonos) da Faculdade de Direito de Lisboa, desde sempre tiveram um papel muito activo, quer dentro, quer fora da Faculdade. Este activismo, remonta desde os primeiros momentos, em que adquiriam a instrução superior, inexistente nas colónias originárias, e levavam para as diferentes colónias onde eram colocados (tal qual Prometeu agrilhoado) passando pela consciencialização/Lutas de Libertação/Pós independência, desembocando nos dias de hoje, com significados diferentes é certo, mas com a mesma importância, porque grande parte dos objectivos por quais aqueles tanto pleitearam, ainda não foram alcançados.
Num certo momento, os estudantes consciencializaram-se sobre os diversos problemas que afligiam os seus Países, problemas estes que em certa forma, eram transversais, e posteriormente, deram o passo para as lutas de Libertação nacional. Muitos estudantes abandonaram os seus estudos, muitas vezes a meio, hipotecando as suas hipóteses de ter a vida confortável pela qual tanto almejavam, tudo, para abraçar a nobre causa da independência dos seus Países. Com muito “sangue, suor e lágrimas”, a independência foi conquistada.

O contributo dos Estudantes Africanos da FDL (nas mais diversas áreas, administração pública, diplomacia, ensino, magistratura, entre muitas outras) tem-se revelado extremamente positivo, nomeadamente, no que tange ao aperfeiçoamento das instituições e consolidação da Democracia dos diversos Países (Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe). Entre os muitos quadros superiores que tem saído da Faculdade de Direito de Lisboa, muitos tornaram-se académicos, estadistas, e profissionais de grande valor e mérito socialmente reconhecido. É da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, o primeiro doutoramento em direito pela Universidade de Lisboa de um não – português e do primeiro doutoramento em direito por uma Universidade Pública Portuguesa de um país africano de língua oficial portuguesa e também, mais de meio século, o primeiro doutor em direito pela Universidade de Lisboa não ligado pela docência -presente ou pretérita – à respectiva Faculdade de Direito. Vénia seja feita.
Apesar desta faceta activa dos estudantes da geração ”Pré e pós independência”, não temos dados que comprovem a existência, naquele tempo de um Núcleo de Estudantes Africanos formalmente Constituído.

De acordo com os dados disponíveis, tal lacuna apenas veio a ser colmatada, vários anos depois, em 1997, data da primeira eleição para os órgãos do Núcleo de Estudantes Africanos.
Se for possível identificar-mos as etapas mais marcantes da história dos Africanos na Faculdade de Direito de Lisboa (divisão esta, com um cariz meramente indicativo, sem desprimor por tudo que de relevante tenha acontecido e que não conste desta divisão), podemos considerar como sendo o primeiro período, o momento da consciencialização/lutas de Libertação nacional e um segundo período, o momento das primeiras eleições para os órgãos do Núcleo de Estudantes Africanos da Faculdade de Direito de Lisboa, pois vieram dar forma a todo o trabalho realizado pelas anteriores gerações de Estudantes.

A Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, aquando da realização dos estudos em homenagem ao Professor Doutor José de Oliveira Ascensão, não tendo como agradecer o contributo dado pelo Professor no último quartel do Século XX ao Direito Civil e consequente Reputação da Faculdade, Curvou-se, num gesto de agradecimento, humildade e respeito, porque, por muito que se escreva, as palavras serão sempre insuficientes para enaltecer, o Homem, a Pessoa e a Obra. Tendo este belo gesto como exemplo a seguir, o Núcleo de Estudantes Africanos, Curva-se, convictamente, perante todos aqueles Africanos que passaram pela Faculdade, ainda antes das consciências nacionalistas, pelos nacionalistas, pelos outros que de uma forma ou de outra, contribuíram para dignificarem os seus Países, e também, perante todos os Estudantes que estiveram presentes nas primeiras eleições para os órgãos, e tudo fizeram para que o Núcleo de Estudantes Africanos da Faculdade de Direito de Lisboa, tornasse realidade (não sabendo o nome de todos eles, urge invocar o nome daqueles que constam da acta número um, os “Pais Fundadores”, por assim dizer mas que representam todos os outros: Carlos Moisés, Apolinário das Neves, Bernardino Araújo, António Duarte Almeida, Rogério Zabila, Augusto Baptista, José Tavares, António Filipe Bunga, Mário Gavião, Estevão de Jesus, Rui Carvalho Simões, Marco António).

Pois bem, a partir de 1997, um nova página abriu para os Africanos da FDL. Duas Listas, A e C, concorreram para os órgãos do Núcleo, tendo a primeira saído vencedora. A Faculdade passou a ter um Núcleo de Estudantes Africanos formalmente constituído, um organismo representativo dos Estudantes Africanos desta Faculdade, de natureza informativo-cultural e académica, sem fins lucrativos nem políticos (artigo 1/1 versão originária dos estatutos).

Não podendo enumerar todos aqueles que passaram pelo Núcleo de Estudantes Africanos, passo a citar do nome dos sucessivos presidentes da direcção, que por sua vez, representam todos aqueles que com os mesmos, labutaram, honraram e dignificaram o Núcleo.

De acordo com os dados constantes do Livro das actas da Mesa da Assembleia do NEA-FDL, foram presidentes da Direcção do Núcleo de Estudantes Africanos os seguintes estudantes: Apolinário das Neves, Augusto Costa Baptista, Paulo Ricardo Alves, Waldemar Freitas Tadeu (juntamente com Eder Ferreira, escreveu a “acta do estudante”, era de grande pujança do NEA-FDL), Pakissi Njinga, Sílvia Reis, Yara Torres, Aliswaly Neto, Elisa Mendes (apenas uma palavra: revitalizou o Nea. Citando a própria, “é calando que se aprende a ouvir, é ouvindo que se aprende a falar, depois, é falando que se aprende a calar”), Ednilson dos Santos, (meritoriamente, teve a iniciativa de rever os Estatutos do Nea-FDL e dar um novo fôlego ao NEA. A revisão estatutária, foi conduzida por Diamantino Soares, mediante Proposta de revisão da autoria de Démis Almeida. Entre as maiores conquistas, podemos mencionar a inclusão dos Afro descendentes como membros/associados ordinários do NEA-FDL, em igualdade de circunstâncias com os Africanos, artigos 1/1 e 9/1-a, da nova redacção dos Estatutos do NEA-FDL).
Importa agora, fazer uma breve incursão sobre os estatutos do NEA-FDL, e realçar alguns pontos essenciais da nossa carta fundamental.

Em primeiro lugar, o Núcleo dos Estudantes Africanos da Faculdade de Direito de Lisboa, é um organismo representativo do estudantes africanos e afro-descendentes da Faculdade, tendo como objectivos, entre muitos outros, facilitar a integração em Portugal, dos estudantes africanos e afro-descendentes, operar no sentido de permitir que cada estudante possa realizar com êxito as suas ambições académicas, divulgar e desenvolver os valores culturais de cada comunidade Africana na FDL, promover debates no sentido de aprofundar conhecimentos e despertar o interesse para a realidade Africana e também, actuar no sentido de fortalecer, em colaboração com os restantes Núcleos de Estudantes Africanos, todos os Núcleos de Estudantes Africanos que têm estado mais apagados nos últimos tempos, de forma a melhor defenderem os interesses dos estudantes das respectivas faculdades e comunidade em geral.

Tal como está claramente plasmado nos estatutos, o NEA é um organismo de cariz informativo, cultural, e académica, sem fins lucrativos nem políticos. Uma palavra sobre este último ponto. Sendo uma ponte entre a realidade Africana e comunidade académica, o NEA tudo fará para dignificar a mesma realidade, dando o total apoio, quando tal for solicitado, mas nunca, nunca mesmo, assumirá quaisquer compromissos políticos, será pólo de um partido, defender ou criticar uma cor politica em particular. Caso tal venha a acontecer, será uma violação manifesta do nosso fim, não devendo nenhum estudante estar passivo perante tal acto. Com esta atitude o NEA não se revela anti politica, mas antes pelo contrário, dá a politica o que é da política e ao NEA o que é do NEA.

Política não é apenas militar num partido político. Qualquer cidadão é político, desde que actue na sua vida diária de forma a melhorar o meio onde está inserido, ou, recorrendo a frase supra citada, “…Numa grande democracia moderna, a vida associativa privada tem efeitos gratificantes muito mais imediatos do que a simples cidadania…” A politica, quando bem feita, é uma actividade nobre, gratificante que define a vida de cada cidadão em particular, procurando as formas que melhor alcancem a paz, prosperidade, e bem-estar para a sociedade. Por isso, nenhum cidadão deve estar alheio, porque é o seu futuro que está em jogo, e como se diz na linguagem popular, “cada povo, tem o governo que merece”. Simplesmente, queremos abrir as portas para qualquer estudante que queira dar o seu fiel contributo, deixar algo com que os futuros colegas possam contar, e proteger o Núcleo de Estudantes Africanos de quem queira usar o Núcleo como alavanca, ou, representação do que quer que seja.

Entre os princípios fundamentais, impera a participação democrática de todos os estudantes africanos ou afro-descendentes da Faculdade (“o NEA é palco e nós todos somos actores, ajeitem-se para que todos possamos caber”) e a Igualdade.
Para terminar, invocamos o saudoso Professor Sebastião Cruz, num brilhante passo, totalmente adequado ao NEA “…O ius romanun é semelhante a uma árvore. Nasce, pequenina, vai-se desenvolvendo, começa a florescer, principia a frutificar, pouco, bastante, muito, muitíssimo. Depois a frutificação diminui, e quando já não produz mais frutos, encontrando-se porém num estado de boa conservação, é cortada (a codificação) para ser transformada em boa madeira, que será utilizada nas melhores construções (jurídicas) de todo o mundo. É pois uma árvore que não chega a morrer. Tem vida, como árvore (são os 13 séculos do ius romanun) e depois uma superveniência, como esplêndida madeira (são os 14 séculos de tradição romanista…”. Com isto, e se a ginástica mental for permitida, queremos dizer que o Núcleo de Estudantes Africanos é semelhante a uma árvore, nasceu pequena, no princípio era poucos alunos, foram chegando mais alunos e floresceu. Os frutos, são os alunos que ela forma dos várias cantos dos PALOP, que serão as madeiras, para o desenvolvimento dos respectivos Países. Têm vida como árvore, porque é feita pelos alunos que enquanto lá estão e deixam um pouco de si próprios, e superveniência como esplêndida madeira que nunca chega a morrer, porque continua na pessoa dos próprios alunos que nunca hão de esquecer o Núcleo de Estudantes Africanos da Faculdade de Direito de Lisboa.


Lesses Cardoso
NEA-FDL